DOIS PÊNALTIS
Posted: segunda-feira, 30 de junho de 2014 by ajeugenio in Marcadores: Copa do Mundo, Futebol
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Anos 90. Eu era apenas um moleque recém-saído das fraldas e que estava tendo contatos iniciais com o futebol. Lembranças resumiam-se à camisa alvinegra do Corinthians, ao tetracampeonato da seleção brasileira e à camisa tricolor do Grêmio [OK, não sou gaúcho, não tenho passaporte gaudério e não costumo falar "Taca-le pau no carrinho, Marcos", mas aquela camisa me chamava a atenção por causa do título da Libertadores de 1995. Parêntese feito]. No entanto, uma coisa que dona Maria, aka primeira-dama e matriarca do clã dos Eugênios, sempre dizia o seguinte para quem quisesse ouvir, em alto e bom som: Taffarel era um puta de um frangueiro [parêntese #2: ela nunca falaria um palavrão. Grifo meu]. E passei os anos seguintes com aquilo martelando na cabeça. Não conseguia conceber a ideia do velho TAFFA, o frangueiro-mor para dona Maria, com a camisa #1 da seleção.
2014. Copa nesta quebrada que tem palmeiras onde canta o sabiá e onde cerveja de milho é instituição nacional. O goleiro que veste a mesma camisa #1, usada por Taffarel tempos atrás, é Júlio César - não o imperador romano, cara pálida. O mesmo Júlio César que foi considerado um dos melhores goleiros do mundo em 2010. O mesmo Júlio César que, ao cair em desgraça após a derrota do Brasil para a Holanda naquele mesmo ano, comeu o pão que o diabo amassou no QPR, da Inglaterra, e hoje foi virar goleiro de hóquei jogar no Canadá - consta que ele não encontrou Luíza, AQUELA. O mesmo Júlio César que, até o jogo Brasil x Chile, era visto com desconfiança até por Stevie Wonder. O mesmo Júlio César, que era um dos alvos preferenciais, se não o prioritário, de todo e qualquer corneteiro de plantão.
1998. Semifinal entre Brasil x Holanda (!!!!), válida pela Copa de 1998, na França (quem comprou? Sei lá). Após um puta sufoco, que terminou em 1 x 1, o jogo foi à decisão por pênaltis. Dona Maria saiu da sala, pois não queria ver aquele massacre psicológico [ei, Thiago Silva, ela pode fazer isso, fera]. Pois bem, aquele mesmo Taffarel, sobre quem cresci ouvindo que era um frangueiro que não merecia nem jogar o "Desafio ao Galo", pegou dois pênaltis [de Cocu e Ronald de Boer? I think so]. Da noite para o dia, o velho TAFFA virou herói nacional. Até o Brasil tomar uma traulitada contra o exército azul, liderado por Zidane, é claro.
28 de junho de 2014. O Brasil tomou um puta de um sufoco contra o Chile, que tinha a melhor seleção desde quando Pinochet ainda engraxava coturnos no exército local. Era um adversário de respeito e adepto da ousadia e alegria, mas não deixou de ser vergonhoso, o resultado. Ainda mais pelo nervosismo e letargia da equipe em campo, em especial no segundo tempo. Durante a decisão por pênaltis, cuja disputa o CAPITÃO Thiago Silva não quis ver por estar ~tenso~, aquele mesmo Júlio César pegou dois pênaltis - OK, contou com a sorte, ajudou a classificar a seleção e ainda salvou as peles de Willian e Hulk. Aquele mesmo Júlio César, que desde 2010 só entrou em furada.
Dizem que Copas do Mundo criam heróis, vilões, coadjuvantes de luxo e tramas dignas de concorrer à Palma de Ouro de Cannes - ou à Framboesa de Ouro, sei lá. Dizem que Copas do Mundo podem levar pessoas do céu ao inferno em questão de dias - Suárez, que o fez com unhas e dentes (!!!!), que o diga. Dizem que Copas do Mundo podem mudar paradigmas e fazer impérios ruírem [adeus, tiki-taka]. Mas Copas do Mundo também podem dar tons épicos a vidas e levá-las da desgraça à redenção. Esse foi o Caso de Júlio César após a vitória (ou derrota moral?) contra o Chile. Mesmo a seleção tendo saído com a imagem arranhada, ele foi o cara daquele jogo. Isso até contra a Colômbia, que terá, na próxima sexta-feira, a grande chance de acertas as contas com o passado e mostrar que a geração de Higuita, Rincón, Valderrama e cia. não encantou o mundo do futebol em vão.
Até lá, a honra brasileira (em campo, é claro) está nas mãos de Júlio César.