EMOTION SICKNESS

Posted: terça-feira, 24 de junho de 2014 by ajeugenio in Marcadores: , ,
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Acordar era um martírio para ele. Pensar em sair da cama e viver em sociedade fazia sua respiração ficar mais e mais ofegante. Seu desânimo e desilusão eram visíveis até mesmo em seu senso de humor, cada vez mais corrosivo e que alternava entre a ironia com a agressividade. Seus pais, amigos e até mesmo uma ex-namorada estavam cada vez mais preocupados com o seu comportamento, que transitavam entre a letargia e a autodestruição. Tudo o que ele queria era ser esquecido por eles. "Todo o mundo tem coisas mais importantes para pensar do que se preocupar comigo, como a consistência da merda de cada um deles, sei lá", ele pensava, entre um copo e outro de cerveja. Ele não se julgava digno da preocupação de ninguém. Nem dos pais, tampouco dos amigos. Menos ainda da puta que passara a ser sua confidente e psicóloga, digamos assim.

Ele havia desistido de tudo, pelo menos emocionalmente falando. Não sentia mais tesão em trabalhar, mesmo sendo aquele emprego o trabalho de seus sonhos. Ele havia desistido de cuidados pessoais básicos - sua barba, cada vez mais espessa, parecia a de um hipster; e as roupas, cada vez mais rotas e com odor cada vez menos agradável. Ele havia desistido de se alimentar. Ele não sabia dizer a origem do vazio e do desespero que ele sentia. O fato é que aquilo, mesmo sendo de origem desconhecida, havia tomado conta dele e ele não sabia como se livrar daquilo. Era como se nada mais fizesse sentido em sua vida. Em suma: ele havia desistido de si próprio. Ele havia desistido de viver.

Sair com os amigos - leia-se os que ainda o suportavam - era divertido, mas a alegria era fugaz e efêmera. Em segundos, ele voltava à letargia moral. Sexo? Era algo cada vez mais mecânico e só por necessidade fisiológica, ou seja, nada de prazer. Chorar? Ele queria, mas era incapaz. Ele havia se isolado de seu mundo quando percebeu que queria ajuda e queria gritar "Socorro!" para o mundo, mas o seu orgulho o impedia de fazê-lo. Ele estava se afastando, pouco a pouco, daqueles quem ele gostava, tal qual um cão que sente ter chegado o momento de sua morte. Ele queria pedir por auxílio, mas quando tentava, travava e recorria à vibe blasé para não parecer uma criança indefesa. Ele tentava conversar, mas não via nada nos olhos dos outros quando tentava se ver lá. Era como ele não existisse para si próprio.

O seu comportamento estava mais inconsequente, como se ele procurasse pela morte em cada esquina, sem medir riscos ou consequências. Certa noite, após sair de uma festa na casa de uns amigos, ele foi encontrado por um grupo de caras que saíam espancando qualquer pessoa que vissem pela frente. A cada golpe sofrido na barriga, na face, no nariz e nas pernas, ele se dividia entre a dor e o arrependimento. Arrependimento de ter desejado morrer. Arrependimento de não ter valorizado a si próprio - ele não era tão loser como ele sempre julgava. Arrependimento de não ter dito o que pensava e sentia. Arrependimento de ter sido tão ausente, a começar de sua própria vida. As lágrimas saíam furtivamente e se misturavam com o sangue que saía do nariz e dos ferimentos na cara. Pouco a pouco, a respiração foi ficando cada vez mais difícil, e a visão, cada vez mais turva. Ele perdera os sentidos. Ele se perdera de vez de si.

2 comentários:

  1. O texto é legal. Mas acho que o título deveria ser "Ele e Aquilo". Porque eu não descobri quem é ele.

  1. ajeugenio says:

    Fala Luizinho, tudo bem? Cara, first of all, valeu por ter lido o texto e opinado sobre. Bem lembrado, poderia ter sido, sim. Na verdade, tentei dar um viés anônimo ao personagem, meio numa vibe beeeeem nonsense e pretensa/porcamente inspirada no "Ensaio Sobre a Cegueira".

    Forte abraço.