DOSES DE ADRENALINA

Posted: terça-feira, 1 de outubro de 2013 by ajeugenio in Marcadores: , , , ,
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Precisava esquecer-me da Lia, uma ex-date de um tempo atrás, de qualquer maneira. Logo eu, que sempre fui blasé e não me importava com muito mais do que uma noite com uma mulher - vá lá, um ou outro remember, se a vibe fosse foda -, fui ficar atraído por ela. Dia da caça, outro do caçador, dizem. Pior foi vê-la na noite anterior com outro cara. Aquilo doeu e, pior, não foi por orgulho. Sabe-se lá o que fui ver nela. Se tem algo na vida que me deixa puto, isso é sentir-me vulnerável. Não sou machista e apoio totalmente o feminismo - não o extremismo, quero deixar claro -, mas faço de tudo para não me envolver com ninguém, simples assim.

Estava vagando sem rumo, procurando por um bar e, com um pouco de sorte, uma boa companhia para passar a noite. Precisava esquecê-la de qualquer maneira. Estava nessa vibe quando encontrei o Beto, brotherzaço meu de longa data. Ele estava sem rumo também. Só não na mesma vibe que a minha porque ele é o típico malandro: o cara manja como poucos a arte de não sentir nada por ninguém - se muito, pela mãe. "Cara, tô na merda e não sei por que caralhos não consigo tirar aquela mina da cabeça", confidenciei, com ar derrotado. "Merda acontece, irmão. Bora beber e já era", ele respondeu de bate-pronto. Era só desabafar um pouco entre umas e outras, cada um encontrar uma mina para passar a noite e já era. Se nada virasse, o Casarão (ou "Boate Azul", como batizamos a digna - ops - casa) seria o destino do fim da noite. Aquilo era o recurso desesperado, mas melhor aquilo do que terminar na mão.

Assim a noite ia, entre uma garrafa de cerveja e outra, intermediados por altas risadas, canalhices em doses cavalares e olhadas ao melhor estilo Pereio para as mulheres no bar. E os alvos já estavam devidamente escolhidos, mas aquela velha historia de que o peixe periga morrer pela boca - ou melhor, pelo olho e por pensar com a outra cabeça -, ela sempre vem à tona. Ao chegar no balcão, vejo a perfeição - ou convite à roubada, se preferir - em pessoa: sorriso de quem pede para gozar na cara, olhar de quem quer te dar, corpo escultural, peitos proporcionais, com o copo vazio e ainda estava sozinha. O que qualquer homem à deriva faz? Enche o copo, simples assim. Talvez Pedro tenha gritado bem ao fundo que era uma cilada, mas Bino - ops: eu - estava pouco se fodendo àquela merda toda. Eu era todo ouvidos, olhos e pau para ela, nada mais. Comecei a puxar papo, conversar e já estava aproveitadndo o barulho ambiente como pretexto para mandar aquele papinho mole e canalha ao pé do ouvido. Mas se tem algo que acontece na minha vida, isso é merda. Ela estava sozinha era o caralho: o namorado dela havia ido ao banheiro e voltou bem quando o papo estava para lá de desenvolvido - "por que caralhos ela não me cortou na hora se ela estava acompanhada, porra?", pensei. Para foder com a merda toda, o cara parecia ser segurança de baile funk na minha quebrada. Estava fodido e não parecia nada para servir com o álibi.

Qual saída que qualquer cara metido a malandro toma? Socializa com o "sócio". Encher o copo e começar a conversar com o cara, além de inventar uma desculpa qualquer - "Ela estava sozinha e estava fazendo companhia, sabe como é" - era a saída de emergência. Mas a resposta do cara foi, no mínimo, para fazer qualquer um sair correndo: "Sou campeão paulista de caratê, cara", ele mandou na lata. Por fora, o meu lado cara de pau e a minha aparente indiferença etílica pareciam transmitir sensação de controle, mas por dentro, fera, estava todo cagado de medo [metaforicamente falando, é claro]. Nesse meio tempo, o Beto, estranhando a demora para pegar uma simples garrafa de cerveja, colou no balcão para ver o que estava acontecendo e, claro, assustou-se com o que viu. "Entendi todo o lance e o que se passou na sua cabeça, mas estamos fodidos". É, pelo jeito, estávamos, sim.

Segundo ato: o "sócio", após mostrar fotos de lutas, ligou o foda-se para a breja e partiu para aquela bebida alemã cujo nome é impronunciável após a segunda dose. "Era a bebida preferida do Hitler", emendou. E não é que o puto colocou aquela delícia em forma de mulher para contar toda a porra da história da Jaggerm...foda-se a merda do nome?! Mesmo no modo "mayday! mayday! mayday!", só conseguia ver os lábios, os seios e todo o resto em slow motion - juízo para quê, não? Para completar, o "sócio" mandou a seguinte, após a aula sobre o lado alcoólico da II Guerra Mundial: ele a conheceu dançando no queijo do Love Story. "Ela é carente e por isso sorriu quando disse que aquele lugar, naquela noite, só valia a pena por causa dela", pensei, tentando ligar os pontos. E ele devia ser da turma dos Balotellis, daqueles que apostam a namorada no pôquer, por falar aquilo. Mas qualquer tipo de raciocínio foi embora com o último gole de cerveja quando ele chamou todo mundo para fora. "Vai dar merda essa porra aí", foi o que pensei na hora. Creio que o Beto pensou o mesmo.

O clima continuava amistoso, mas a tensão estava tão presente no ar quanto as minhas pernas tremendo - de medo - sob as calças. Correr não estava nos meus planos e, enquanto pensava em uma alternativa, as garrafas no chão começavam a ficar mais atraentes. Já estava começando a considerar a reatar com a religião e prometer passar um ano sem frequentar o Casarão, beber, ir ao templo de bicicleta, sei lá. E parece que as minhas pseudopreces foram atendidas: em questão de minutos, o cara, já falando mole e com jeito de quem ia brigar com o primeiro que visse, decidiu descer o vale com a mina. Aliviado, ainda tive tempo de dar a última conferida.

Segundos depois, eu e Beto nos entreolhamos aliviados e, do nada, emendei: "Irmão, acho que alguém lá em cima vai pra caralho com a nossa cara". "Pra caralho, irmão", ele completou. Corpos devidamente fechados e copos igualmente cheios, voltamos ao plano A. Pelo menos, ali, não haveria nenhum risco de espancamento e a briga foi bem mais agradável no fim das contas. E quanto à Lia, ela já havia virado passado.

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