INDÚSTRIA FONOGRÁFICA: HEROÍNA, VILÃ OU MACUNAÍMA?

Posted: segunda-feira, 9 de janeiro de 2012 by Mau Júnior in Marcadores: , , , , , , , , , ,
2



Na última semana, Dan Auerbach e Patrick Carney, guitarrista e baterista da banda The Black Keys, respectivamente, culparam a banda de rock (?) Nickelback, em entrevista à matriz estadunidense da revista Rolling Stone, pelo “assassinato do rock”. O motivo do crime de lesa-humanidade musical é o fato de os canadenses serem volta e meia considerados como “a maior banda de rock do mundo”.

Essa declaração, apesar de elitista, tem lá seus méritos. É inegável que dez entre dez músicas do Nickelback têm elementos previsíveis e refrãos que mais parecem chicletes, de tão previsíveis. Algo semelhante com o que rolou por estas bandas, mais especificamente sobre Michel Teló e Los Hermanos. Pelo menos, o The Black Keys não gravou nada tão “comercial” como Anna Júlia, ao contrário dos (bons, é verdade) barbudos da PUC carioca.

Esses dois casos são exemplos – bobos, talvez – de como a indústria fonográfica funciona: traz caras e bandas incríveis, ao mesmo tempo em que “lixos” culturais são trazidos à tona. Ou, como disse o poeta-depressivo-loser Augusto dos Anjos, “a mão que afaga é a mesma que apedreja”.

O que rege, invariavelmente, é a grana. Para ter uma ideia, os Beatles foram rejeitados (!) pelo empresário Mike Smith na gravadora Decca, em 1961, porque ele achou que o quarteto de Liverpool não seria, digamos, comercialmente falando viável. Outro caso: os Rolling Stones, ainda em início de carreira, tiveram de abrir mão da presença do tecladista Ian Stewart, simplesmente porque ele era “feio”. O que lhe restou foi apenas foi um lugar no backstage, como membro não-oficial da banda.

Por outro lado, é inegável que muita coisa boa, além de ícones da história da música – The Doors, Jimi Hendrix, Eric Clapton, entre outros –, mas muitos enlatados vieram à tona. Por exemplo, pode ser citada a – eficaz e ótima – linha de produção da Motown, que jogou aos holofotes nomes como Marvin Gaye. Mas, por outro lado, movimentos como o reggae e o punk foram “neutralizados”, quanto às respectivas cargas ideológicas, por meio da exploração excessiva de seus símbolos estéticos.

Em solo nacional, houve nomes icônicos que vingaram, como Chico Buarque, os baianos Gil e Caetano – além de Bethânia e Gal, é claro –, Roberto Carlos (vá lá, apesar de todos os pesares comerciais, é preciso tirar o chapéu para o tiozinho, pelo conjunto da obra) e o “síndico” Tim Maia. Mas nomes como Odair José – hoje mito, diga-se – quase foram jogados à sarjeta midiática por causa da repetição excessiva, condicionada à idolatria entre as massas. Isso além do caso Quixabeira, é claro.

Enfim, a indústria fonográfica funciona assim. Para o bem e para o mal. Mesmo que o conceito inerente a ela seja condenável – para não dizer “uma merda”, mesmo –, ela será sempre assim. Algo entre a essência de Macunaíma, o anti-herói, e ao mote da lei de Gerson, ou seja, levar vantagem em tudo. Uma merda. A banda (!) toca assim, mas é assim desde os primórdios. Cabe a nós, independentemente do gênero musical ou de quaisquer outras variáveis, decidirmos o que iremos ouvir ou não.

Apocalípticos e Integrados pós-modernos

Posted: quarta-feira, 4 de janeiro de 2012 by Mau Júnior in Marcadores: , , , , ,
0



Não é de hoje que o universo cultural está dividido - vá lá, não tão dividido assim - entre a cultura tida como "erudita", ou melhor, não tão acessível, por causa de uma série de motivos, sejam eles relativos à estética ou ao teor da mensagem; e a popular, marcada por elementos que sejam facilmente identificados pelo grande público, pelas massas.

Apesar de todo o mimimi debate sobre esse tema, o ápice foi atingido após reportagem na revista Época, na qual o artista pop sertanejo Michel Teló foi retratado como, resumindo a história, o cara do momento. Além disso, o cabra foi bisonhamente retratado como o artista que traduzia os valores da cultura brasileira, como se desde o maracatu aos costumes sulistas estivessem em seu trabalho. Nem será necessário falar sobre o fato de ele estar hypado na gringa, com direito a danças feitas por Cristiano Ronaldo, atacante do clube espanhol Real Madrid; e por, até mesmo, pelos soldados israelenses - aliás, a one hit wonder Ai, se te pego está bombando por lá tanto quanto as bombas jogadas contra os palestinos em Gaza.

Pois bem, como se não bastasse, Bruno Medina, (ex?) integrante do Los Hermanos, publicou carta aberta na qual era feita crítica irônica - e recalcada, por que não? - ao sucesso do cidadão, justamente pelo "efeito chiclete" causado pela execução em loop eterno música em questão. Além da presunção intelectual, o fator complicador é justamente o fato dos "barbudos" serem autores de um dos maiores hits "grudentos" do rock nacional: Anna Júlia, uma das maiores afrontas do gênero, ao ponto de ter ainda bem ter sido renegada pela própria banda. Mesmo com regravação feita pelo eterno beatle George Harrison e a porra toda tudo mais.

Pouco depois, Fernando Vives, colunista da ótima revista Carta Capital e que atende pela arroba @sorryperiferia na twittosfera, soltou texto no qual dizia que o gringo gosta tanto de Chico Buarque quanto de (guess who?) Michel Teló.

Vamos por partes: para nós, habitantes mortais dos trópicos, achamos - e com razão - comparar quem quer que seja ao Chico Buarque, seja Teló ou os barbudos da PUC Carioca, é uma afronta ao bom senso. [nota do escriba: gosto muito de LH, mas essa foi indefensável]. Mas, parando para pensar pragmaticamente, há o outro lado da moeda. Não fazemos distinção sistemática entre Frank Sinatra e Lady Gaga. Por que? Mesmo sabendo que há abismo conceitual, em relação à música e à - por que não? - intelectualidade, tratamos as discografias de ambos com certa proximidade, por serem frutos de outra cultura, nacionalidade, whatever. Nada mais natural que joguem na vala comum Teló, Chico, Los Hermanos, Gaby Amarantos e o que mais estiver no caldeirão cultural que é natural da terra que tem palmeiras onde sabiás cantam e são abatidos.

Isso não quer dizer que a discussão será reduzida à questão dos Apocalípticos e Integrados, livro obrigatório do semiologista italiano Umberto Eco e que não terminei de ler no qual é feita distinção entre os conceitos da Escola de Frankfurt (ALE), em que tudo o que era fruto da cultura de massas era passível de ser tratado como lixo cultural; e os funcionalistas, que abraçavam a causa da cultura feita para o povo, em caráter comercial. 

Talvez esteja um pouco mais próxima da linha dos caras da Escola de Birmingham (ING), na qual estudiosos daquela quebrada defendiam que a cultura popular era instrumento de identificação e de representação de determinado grupo social, ao passo em que a cultura de massas - indústria cultural ou qualquer outra porra nomenclatura que queiram dar - misturava elementos da cultura do povo, transformando-a em produto meramente comercial. Um exemplo clássico é a música Quixabeira, que é meramente uma compilação de cânticos entoados por lavradores da cidade de Quixabeira (não Quixeramobim, tudo bem?) e que, após receber roupagem mais "digerível" e de, virou hit na Bahia. Basta dizer que virou música de micareta? 

Esse assunto não será tão estendido, até porque não se trata do Observatório da Imprensa - aliás, a única ambição deste blog é ser lido por uma única pessoa entre 7 bilhões (risos). Se Ai, se te pego/Oh, if I catch you/Xing ling song é boa ou não, isso não dá para discutir rasamente - que reservemos alguma mesa no Sujinho ou em algum boteco para fazê-lo, então -, mas algo há ali. Como disse Nara Leão certa vez, mesmo que determinado trabalho - musical, audiovisual, whatever - não for conceitual e esteticamente bom, tem méritos por atrair as massas. 

Coincidência ou não, esse é o caso de Teló: seja por causa da letra simplificada e de fácil assimilação ou por causa do ritmo comercialmente bem aceito, o hit está para lá de hypado. Se isso é bom ou ruim, isso vai da cabeça de cada um. Mas será que vale tanto estardalhaço por causa do sucesso do cabra? É tão-somente um hit de verão, nada mais. Ah, alguns puristas caíram matando em cima de Elvis Presley e dos Beatles há mais de 50 anos por causa da "simplicidade" de seus sucessos, mas esses mesmos não contavam que ambos dos ícones seriam responsáveis por alguns dos maiores clássicos da história da música contemporânea.

Enfim, tirem suas conclusões e, também, separem suas pedras para atirarem-as em mim.